Cultura, movimentos corporais, música, disciplina, história, cidadania, responsabilidade e respeito, são alguns aprendizados que um capoeirista levará para a vida toda. A capoeira vem ganhando espaço no âmbito escolar, e para compreendermos melhor a relação capoeira e educação o educa sempre convidou Lindinalvo Natividade, o mestre Lindi, para falar sobre o assunto e contar um pouco de sua história.
M.L - Em 1991, conheci a capoeira de
rua através de um vizinho. Em 1992, ingressei no grupo de Capoeira (Associação
de Capoeira Berimbau Dourado), Depois em 1993, nosso mestre se integrou no
grupo Capoeira Luna, de São Paulo, onde permanecemos até 1996, quando fundamos
a Escola de Capoeira Arte Brasileira. Na época recebi o cordel de instrutor
(verde/amarelo e azul). Na escola recebi a corda de monitor (branco/verde) e de
professor (branco/amarelo). Em 2001,
tive a oportunidade de ingressar na faculdade de Educação Física no Centro Universitário
Volta Redonda.
Neste período, mestre Vinte afastou-se
temporariamente da capoeira. Aí juntamente com alguns alunos fundamos o Centro
Esportivo de Capoeira Quarto Crescente em 17 de março de 2012.
Em 2004 fui contramestre (vermelho/branco). E para simplificar, posso dizer que a capoeira
me preparou para o desenvolvimento de uma dissertação do mestrado. Em 2011,
recebi a graduação de mestre.
2- Como
você atua na capoeira hoje? Conte um pouco do seu trabalho.
M.L -Atualmente divido as aulas de capoeira com nosso grupo de educação física em Barra mansa e Rio Claro, no estado do Rio de Janeiro. No grupo, a intervenção que fazemos é em busca de uma capoeira para todos com uma formação cidadã que possibilite aos nossos alunos a preparação para a vida em sociedade, respeitando as pessoas.
Mantemos dois projetos: um desde 1997, antes mesmo da fundação do
grupo, chamado Capoeira no bairro, onde o objetivo era levar a capoeira aos
bairros distantes do centro de Barra Mansa, possibilitando as crianças carentes
conhecerem um pouco da nossa arte. Dois bairros continuam desde 1997: São Pedro
e São Luiz. O outro tem foco mais na comunidade escolar. Chama-se "Saindo da rua
e entrando na roda". Na escola, trabalhamos a capoeira em todas as fases do
ensino fundamental, com aulas teóricas, práticas e muitas discussões
relacionando fatos do passado com acontecimentos presentes, buscando uma
conscientização crítica sobre a capoeira e como esta sempre foi alvo de
controle por parte da elite dirigente. Claro, respeitando a série de cada um.
3- Quem
pode fazer capoeira? A partir de que idade?
M.L- Toda e qualquer pessoa. Em agosto de 2011, participei do
congresso brasileiro de capoeira escolar na USP. Pela primeira vez vi em uma
roda, deficientes visuais, físicos, auditivos, mentais e nós os ditos
“normais”. Foi muito gratificante ver a força de vontade que eles têm e a
determinação deles. Em nosso grupo, aceitamos crianças a partir de 05 anos. Há
ocasiões em que menores de cinco anos fazem aula, mas explico aos pais que a
criança tem um período de desenvolvimento motor, e muitas coisas elas ainda não
farão. Às vezes os pais querem que os filhos cheguem na roda e se portem como
verdadeiros mestres. Coisas de pais corujas.
4- O
que podemos aprender com a capoeira?
M.L- Além dos
movimentos simples, que às vezes nos parece complexos, aprendemos que a Capoeira é uma manifestação da Cultura afro-brasileira e traz
ao longo destes anos, imbricada em sua prática a luta de um povo para manter
seus costumes, suas tradições e suas raízes. Dependendo da abordagem,
aprendemos também que o capoeirista é parte de uma cosmologia, ou seja, todos
ligados aos seus semelhantes, ao ambiente e ao planeta. Há uma parte que eu
especialmente adoro. A musicalidade na capoeira. Ensinar a uma pessoa a cantar,
tocar e até mesmo a confeccionar o seu instrumento é muito gratificante. É isso
e muito mais que a capoeira pode proporcionar.
5-Você
defende a idéia de que deveria ter capoeira em todas as escolas?
M.L- Sim, mas com algumas reflexões. Vou explicar. Sou formado em
educação física, mas acho que não é prerrogativa do professor de Educação
Física ministrar aulas de capoeira (parte técnica) como sugeriu o sistema
CONFEF/CREF. A ele cabe a parte pedagógica da aula, com reflexões sobre o tema.
Também não sou favorável que um capoeirista, mesmo sendo mestre, assuma uma
turma na escola. Com todo respeito ao notório saber dos mestres, a escola é um
espaço formador e transformador da cidadania. São necessários algumas formações
e conhecimentos para atuar neste espaço. Então, só nos restam três
alternativas: 1-professores de Educação Física ou de outras áreas da educação
se filiem a algum grupo e passem a ter uma vivência de capoeira; 2- que Capoeiristas façam cursos de
licenciaturas e; 3 - o que mais ocorre, e eu apóio. Sejam feitas parcerias
entre os professores e capoeiristas para que ambos possam levar o conhecimento,
cada um dentro de sua circunscrição.
6- Gostaria
de deixar alguma mensagem para os leitores do blog?
M.L- Aqueles, que tem vontade mas
nunca entraram em uma roda de capoeira, faça. Vocês verão que é uma coisa
mágica. Com o tempo farão coisas que nunca imaginariam fazer. Já aqueles que
ainda trazem um sentimento de preconceito, digo para excluir isto de seus
corações. Hoje a capoeira se faz presente em mais de 150 países. É praticada de
diversas maneiras, com um enorme número de participantes de ambos os sexos, de
todas as idades, de vários grupos, entidades ou associações. Está nas praças,
nos projetos sociais, nas escolas e nas universidades. Está também nos palcos
de teatro e salas de cinema com destaque aí para a produção de João Daniel
Tikhomiroff e o filme Besouro. Além disso, a prática da Capoeira apresenta uma
gama de multiplicidades e facetas que a tornam um maravilhoso campo de
possibilidades. Quero agradecer a oportunidade do blog educar mais por eu poder
contar um pouco da minha história e como a capoeira mudou em muito os rumos da
minha vida.
Quero agradecer em nome do blog, a atenção e carinho do mestre Lindi e a colaboração de Rodrigo Bosi, na relização desta entrevista.
Sintam-se sempre bem vindos a este espaço educativo!
Erica Bosi
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